sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Primavera gelada

Sentada sob a luz amarela da luminária fico imaginando o que restou de mim depois de todo esse tempo. Palavras não ditas e desejos submersos em um inconsciente completamente distorcido. Restou a paisagem do vazio. Algo que poderia ter sido e nunca foi. Amores discretos e humores perversos.

Em uma primavera gelada e chuvosa fico a espreita esperando o que não chega e uma angústia que corrompe o resto da alma que não perdi. Ouço um desafio emblemático de cobranças severas sobre um destino incerto e o medo dilacera o resto da minha úlcera. Vejo sonhos renascendo ao meio da morte de tantos. Zumbi.

Ao longo de todos os anos me senti distante de tudo – de mim mesma. Assisti apaticamente a vida passar sobre um risco de nuvem azul e aprendi que o medo é o que me move. Areia movediça. Disciplina tem sido o que uma rotina é feita. Penso, aqui, na luz amarela, em tudo que poderia ter sido e feito. Sinto-me estática, andando em círculos para voltar ao mesmo lugar, apenas com medos diferentes e angústias aumentadas. O desejo da fuga retornando ao lar do medo.


Areia movediça de sabores perversos. Salvemos a alma que vos escreve para que não tenha mais direito ao pecado que é a morte. O desamor. O desafeto. A loucura permanente da mente inquieta. O outro através de mim.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Madrugada de Esmeraldas




Madrugada. O sono escapou, como fugitivo preso inocentemente, e agora tenta provar que tudo foi um engano. Vago por essas linhas a procura de algo. E, ao surfar pela web, me encontro com “Esmeraldas”, novo álbum da Tiê.

O terceiro trabalho vem repleto de encantos. A faixa com a participação de David Byrne, “All Around You”, é uma delícia pop com pitadas tropicalistas. Isso não poderia faltar, afinal, o ex-Talking Heads é amante incondicional de Caetano, Gil e Tom Zé.

“Par de Ases” é outra que se sobressai, sobretudo pelo arranjo repleto de camadas de teclados. A sonoridade é culpa do produtor, Adriano Cintra, que além de culpado pelo sucesso do CSS, lançou neste ano a incrível “Animal”. O cara, aliás, está cada vez mais requisitado no circuito moderninho paulistano. Thiago Pethit, por exemplo, deve um boquete a ele, tamanha beleza que o cara imprimiu em “Rock`n Roll Sugar Darling”.
Mas, voltando à Tiê. Passeando por essa noite sem sono, é de felicidade que meus tímpanos se abrem na canção “Máquina de Lavar”. Cordas, guitarra esperta e melodia nos remetem a uma jovem guarda-vanguarda que teria sido perfeita na voz de Wanderléa. E, a seguinte, “Urso”, com a sua batida mezzo-dançante e vocalizes, é perfeita para ficar movimenta os dedos do pé. Sobre o que ela trata? Sei lá.


Apesar da dispersão que a letra da canção citada proporciona, essa colocação não se aplica ao restante do trabalho. Com 12 músicas compostas em parceria com uma galera do bem, como André Whoong, cada texto reverbera um lado confessional que soaria demasiadamente brega se não estivéssemos falando da Tiê. A sua característica de proporcionar poesia simples e deixar tudo mais fácil e lindo, é fator positivo em toda sua carreira. Sua capacidade de traduzir isso em música continua sendo seu principal louvor. E, se o meu sono não chegou, após a primeira audição de “Esmeraldas”, pelo jeito dormirei somente amanhã e irei trabalhar com olheiras orgulhosas, pois vale a pena por no repeat e ganhar a madrugada ao som da ex-modelo da Ford. 

domingo, 23 de novembro de 2014

Não gosto de sexta-feira

Acho que eu não gosto de sexta-feira. Todo mundo comemora este dia, dizendo que finalmente chegou o descanso, tempo de fazer coisa que se gosta. Mas sexta-feira é um dia que estou cansada, um dia que tudo está cheio e que as pessoas ficam incomodadas de falar de trabalho.

Sim, eu sei. O normal é segunda.

E eu gosto de falar de trabalho, porque eu tento fazer coisas divertidas. Coisas que tenham importância para o que eu acredito. Neste momento estou me preparando para ficar 6 semanas no Peru trabalhando voluntariamente em um programa de empreendedorismo social para jovens. E também desejo do fundo da minha motivação (coração) produzir um documentário social com um filme de 15 minutos e uma série de 42 episódios para web. Quero que as pessoas sintam a vibração de escolher seu trabalho. Ao mesmo tempo que descubram que isto não significa sempre estar em mar de rosas. Existe angústia, dúvida, dificuldade, tarefas chatas, mas existe um porquê que ajuda a passar por tudo isso.


Acontece que sempre esqueço de postar aqui na sexta e corro atrás do prejuízo fazendo meu texto sábado ou domingo. Final de semana me parece este tempo mais vazio que uso para tentar arrumar o que ficou pendente nos cinco dias anteriores. Final de semana é dia de arrumar a casa, fazer faxina, compras de mercado, tempo para DR, congestionamento para a praia, fila para o cinema. Mas talvez se todos as 80% de pessoas que dizem que não estão felizes no trabalho ficassem felizes as filas para as coisas boas aconteceriam todos os dias. Ou talvez tivesse mais opções saborosas, feita a medida, no meu tempo, para o meu bolso e para todos os outros gostos também.

Muitas pessoas não acham que isto é possível: ter satisfação de segunda a sexta. Isto é vida de bon vivant, coisa que você inveja e não sabe como deve ser. Me lembra aquela série de tirinhas de como as pessoas acham que é, meus pais, meus amigos, eu e como é de verdade.

Para parar de me deliciar em clichês, deixa eu ir para mais um: tudo tem um lado bom e ruim, do tipo o almoço gratis sempre te custa alguma coisa, só que as vezes o preço vale a pena.

Convido para que acredite comigo, com meus parceiros e com os jovens que irão desenvolver seus próprios projetos sociais. Que curtam 6 semanas de desafio pessoal, desafio profissional, choque de cultura, risada, perguntas e reflexão. Faça parte da campanha Believe with us, no kickstarter: https://www.kickstarter.com/projects/444650780/believe-with-us . E de contorno também para os seus sonhos. Acredite também em si.

Eu não sou Poliana, nem ao menos as pessoas me acham a mais engraçada trabalhando. Sou mais séria no trabalho do que na fila do mercado. Mas acho que todo mundo repete que quer ser feliz na vida e repreende quem fala de meios e tentativas para ser. Repreende até mesmo quem está se divertindo com coisas pequenas. Claro que tem muita baboseira motivacional que não se importa com você, assim como tem muito jeans que não serve para corpo algum. O que eu acho que não deve ser sufocado não é isso. Somos melhores sem diminuir ninguém, somos melhores quando respeitamos as escolhas e forças dos outros. A verdade é que é muito fácil duvidar da nossa capacidade (nossa própria e da dos outros). Só que é moroso passar o dia-a-dia assim. Você quer ser alguém que participou das conquistas de alguém ou antecipou as derrotas?

Existem escolhas para gostar de todos os dias da semana.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Que cor tem o amor?

É da cor verde que eu gosto! Dizia ela.
Eu, que metida perco de calar, digo que o mundo é tão colorido pra de uma cor só gostar. 
Ela então se justifica: Já tentei o azul, bem como o amarelo. Por um tempo até pareceu servir, caiu bem, mas logo vinha a saudade da cor verde. Era o verde que ficava perfeito!
Diz ter tentado o vermelho, porque o vermelho até tinha aquela força que o verde possuía. Gostou! Ficou um tempo vestindo a lembrança que o vermelho trazia.
Ficou satisfeita quando se experimentava em cada sentimento que da cor nascia... 
Era prazeroso. 
A cor rosa trouxe uma espécie de melancolia, gosto de ressaca, de café doce.
O azul trouxera esperança, em uma época que já não a vestia mais. Trazia a cor de sorriso e malicia. Trazia também um traçado de insegurança que ao misturar-se ao enfado da cor branca, resultava em uma espécie de cor jocosa, brejeira.
Quando encontrou a cor preta, algo a sobressaltou. Disse que esta cor causava nela um conjunto de sentimentos; era sombrio e forte, mas uma força que não assustava, uma força bonita, esguia, elegante. Ficou espantada porque geralmente é na cor preta que se esconde o desconhecido, mas aquela que se apresentava para ela, embora escura como o céu na noite, ainda mostrava o lampejo da luz da lua.
A cor violeta, em contrapartida, era tão leve! Tão especial, transparente. Tinha cor de coisa boa. Abraço de irmão, carinho de amigo. Tinha cor de verdade.
No entanto ainda era da verde que ela lembrava. Do contorno que o verde fazia, do friso que a cor exprimia. Era a cor verde!
Não era tristeza de não ter a cor verde para sentir. Não! Era saudade de uma cor que vestisse tão bem nela. Era o verde, ainda o verde...

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

O Pescador de Ilusões


O Pescador de Ilusões

Era uma vez, um pescador que passava horas e horas do seu dia pescando às margens de um lago. Até aí nada de anormal, afinal, este é o dia a dia de muitos pescadores. Porém, este pescador parecia ser diferente. Havia nele algo que era, no mínimo, curioso. Todos em seu vilarejo o chamavam de “O Pescador de Ilusões”. Assim o chamavam pelo fato de nunca terem visto aquele pescador pegar um único peixe, mesmo ele indo pescar diariamente. Embora fosse inusitada, aquela cena passou a ser rotineira e, por tornar-se rotineira, praticamente já não chamava mais a atenção dos moradores daquele pequeno povoado. Contudo, sempre há alguém disposto a prestar a atenção naquilo que costuma passar despercebido e, neste caso, tratou-se de uma criança. Aliás, sempre elas, as crianças.

Curiosa por saber o que aquele homem tanto “tentava” pescar, a tal criança não se conteve e foi ter com o pescador a resposta. Então, chegando diante dele, ela foi logo perguntando:

__ O que o senhor tenta pescar neste lago todos os dias?

O tal pescador, por sua vez, que admirava aquele estilo curioso e ao mesmo tempo inocente de uma criança, mirou-a no fundo dos seus olhos e respondeu:

__ Peixes, minha filha! Todos os dias eu pesco por aqui lindos peixes. Um mais lindo do que o outro.

__ Quais, se eu não os vejo?

__ São de uma espécie quase em extinção, chamada Sonhos!

Sem entender bem ao certo o que acabara de escutar, a criança indagou:

__ Sonhos?

E o pescador mais uma vez respondeu:

__ Sim! Sonhos! Teria espécie melhor de peixes para eu pescar?

A menina, confusa, sem saber como responder, perguntou-lhe novamente:

__ Sonhos? Mas sonhos não são peixes, são?

O pescador, encantado por aquela ingenuidade que só se vê nas palavras de uma criança, sorridente respondeu-lhe:

__ Sonhos podem ser o que você quiser minha filha, inclusive peixes!


Vida de sonhador

Difícil é ser sonhador
Viver onde nem se nasceu ainda
Estar preso em um tempo que ainda virá
É querer dar o próximo passo
E descobrir que o degrau ainda não está lá.

Impossível é não querer sonhar
Viver onde poucos ousam estar
Estar livre para viver um sonho
É poder se sentir acordado
Enquanto dormem aqueles que não conseguem sonhar.

Rafael marIano

(Ilustração retirada de ptkrin.arteblog.com.br)

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

l'amour entre deux tortues... doucement e toujours...



 Com o tempo...

...andando bem a seu jeito, Devagar e Sempre,eles se encontraram, agora sim, de fato, frente a frente.
Pois que apesar de ser indelével e contínuo, com a sua linearidade já posta por terra, seja por físicos, filósofos ou esta outra casta que tanto conta estrela quanto grão de areia, os escritores, outros encontros, de viés, como que esbarrões, meio de lado(o sorriso com o mais puro azul dos olhos-entre um ônibus e outro) já haviam se dado.
De uma feita, a mesma poça, levara os dois a um salto bem parecido, coincidência que caso voltasse a repetir-se de outras formas acabaria por tirar o plausível da história não nos tivesse já acostumados com o absurdo, companheiro contumaz de nossa estada.
A primeira luz da lua após as três noites escuras de um ciclo lunar que seria como outro qualquer, desde que o satélite de nós se desprendera, também escolhera desenhar a silhueta dos vêrtices desta história, cada um em seu mundo, cada qual em seu chão.
Em uma praça enquanto ele arrancava cabeças de formiga, empinava pipa, subia-descia no escorrega e chutava bola, ela passeava de mãos dadas, já que o tempo para um corria enquanto para o outro se espreguiçava para passar.
Quando deu-se o choque do encontro na fronteira das elipses de seus mundos, um vento negro soprava de rastros no chão e com uma lufada capaz de arrancar um baobá pelas raízes ergueu-a até o infinito deixando para trás somente o cheiro de pitanga que ele desde criança sentia não sabia de onde.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Tempo Espaço Experiência

Juliana está distante 160 km de seu primeiro amigo de infância e 28 anos do seu primeiro dia de escola.

Augusto está a duas horas de descobrir uma nova fórmula, utilizando cera de abelha como base, longe 10 km da estratosfera.

Mariana está separada de seu vizinho apenas por uma parede de 12 centímetros de espessura, distante 3.254 dias daquela vez que foi vista pela primeira vez com seus olhos de saudade eterna.

Há quatro meses que aquele cara deixou de acariciar suavemente as costas nuas de Dani, numa tarde tranquila de outono. Ela está a 1 centímetro do beiral da janela de sua casa.

Passaram-se quase vinte mil horas desde aquela vez em que Pinha, sentado nos destroços de uma antiga construção portuária, sentiu que as ondas estavam se fundindo com o concreto. Ele está a duas quadras da Avenida Consolação.

Faz mais de 10 mil minutos que Gustavo experimentou a sensação do primeiro beijo. Ele está há 5.325 Km de Boca Arenal.

Há 676 segundos Jin Down iniciou sua mais recente tentativa de se livrar do alcoolismo. Está a 500 centímetros da garrafa mais próxima.

Isabel não vai sair de casa, pois seu único destino imaginável encontra-se a dois bilhões de milímetros. Faz cinco minutos que ela acordou sobressaltada e acendeu o seu último cigarro.

Rodrigo está a 0.2 centímetros do bisturi. Há 180 minutos ele passava de ambulância no centro da cidade.

Já se foram 25 anos daquele fim de tarde em que Eduardo descobriu que Deus não existia. Às vezes, como agora, ele sente que não há distância que o separe de qualquer coisa.

Isabel está há 1.440 segundos do momento em que, da janela do avião, avistou a circunferência a Terra, quando comprovou num estremecer de corpo inteiro que ela é redonda. Está a dois andares de altura daquela sua professora que lhe reprovou em redação.


Todos eles se encontraram há três horas no vai e vem do centro da cidade, cruzamento da Avenida Consolação com a Rua das Tormentas, nos 45 segundos em que o sinal estava aberto para o trânsito. Ali eles ficaram a poucos centímetros uns dos outros.

O Papa é pop



Por Marcela Uliano da Silva. 

Além dos discursos super ponderados e embasados (em nada?) sobre as eleições presidências brasileiras, hoje não se falava em outra coisa nas redes sociais a não ser na declaração do Papa chicano de que a teoria da evolução das espécies e do Big Bang são corretas.

Deixando de lado os vários problemas relacionados ao "agora pode", "agora não pode" da igreja (e de qualquer instituição que baseie suas afirmações em fé, e não em evidências), vou entrar no que mais me incomoda nessa história toda: eu fico me perguntando o que as pessoas realmente entendem por teoria da evolução

Segundo o site do Globo, o Papa teria afirmado que "... Deus criou os seres humanos e deixou que eles se desenvolvessem de acordo com as leis internas que ele deu a cada um para que eles cheguem ao seu cumprimento...". 

Com essa afirmação, Francisco não me parece estar aceitando o que a teoria (que é tão real e baseada em evidências quanto a teoria gravitacional) de fato sugere: que as espécies evoluem de acordo com a seleção natural, e que esse é um processo não planejado, ao acaso. E constante.

Todos nós descendemos de um ancestral comum, e o DNA como material genético de TODAS as espécies, desde bactérias até o homem, está aí para provar isso. Além disso, as espécies habitantes da Terra não foram sempre as mesmas; as espécies derivam, evoluem. Mais ou menos assim: existe a diversidade gênica (e o sexo tem grande papel nisso!) e então a influência de fatores ambientais, que ajuda a fixar ou eliminar genes (os genes vantajosos ou desvantajosos) criando assim a diversidade, que pode levar a um evento de especiação; a criação de uma nova espécie. Infelizmente não conseguimos acompanhar esse processo durante o nosso tempo de vida porque ele leva milhares de gerações para acontecer.

No entanto, precisamos tirar uma conclusão básica a partir das evidências da teoria da evolução: se as espécies na Terra não foram sempre as mesmas, se elas evoluem constantemente, e se o homem é uma dessas espécies, então o ser humano não é o ponto máximo da evolução. 

Ainda estamos mudando. E estaremos sempre.

Tendemos a utilizar a palavra evoluir com um sentido positivo; como se algum ser (ou pessoa, ou crença, ou raça, ou sistema educacional) mais evoluído fosse algo melhor. E é por isso que eu gosto tanto da expressão derivar. Porque um organismos mais derivado (ou evoluído), nada mais é do que uma espécie mais recente do que um(s) ancestral(is) a ela na árvore da vida. Isso significa que ela passou por mais passos evolutivos do que a outra espécie, mas não que é uma espécie melhor. É bem provável que a espécia mais derivada seja mais bem adaptada ao meio naquele momento, mas isso não significa que seja melhor. Muitas vezes, derivar (ou evoluir) significa perder algumas características (como asas, e assim a habilidade de voar para algumas espécies), e estamos sempre acostumados a associar a evolução com organismos complexos, cheios de diferentes órgãos. Organismos mais evoluídos podem ser mais simples do que os seus antepassados.

Nesse sentido, se entendemos que a evolução é a 'derivação' e 'melhor adaptação ao ambiente e tempo em que vivem', e não significa ser melhor, então temos que concluir que todas as espécies presentes no Planeta Terra hoje têm o mesmo sucesso evolutivo que os seres humanos. São tão bem adaptadas ao momento quanto ele; elas estão vivas agora!

Ou pelo menos por enquanto.

Gastei um momento para escrever esse texto porque acho que as pessoas não se dão conta do que isso realmente significa. Aceitar a teoria da evolução não significa dizer que as espécies evoluíram devagar de seres primitivos aos seres humanos. Aceitar a teoria da evolução significa entender que somos apenas mais um galho da árvore da vida, e que ainda podemos derivar para uma espécie mais extraordinária no futuro. Isso deveria nos dar um sentimento de extrema humildade (que é dificilmente o que vemos os seres humanos fazendo por aí). 

Por mais que o papa, ou qualquer outro líder, afirme que a evolução das espécies é legítima, tenho a forte impressão de que verdadeiramente, ninguém ainda se deu conta do real significado disso. Porque se tivéssemos nos dado conta, não seríamos tão egoístas no trato com todas as outras espécies presentes no Planeta Terra. 

É chegado o tempo de pararmos de abusar da diversidade (consumo excessivo de derivados animais, desmatamento, esgoto não-tratado, para citar só alguns). E agora com a benção do papa. 



Texto publicado pela primeira vez ontem, 28/10/14, aqui

Mais em teoria da evolução aqui

Recomendo esse vídeo do filósofo Mario de Sérgio Cortella. Ótimo para nos darmos mais conta ainda da pequenês da nossa existência. 



segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Sequestraram o meu Jesus!

(Ney viajando pela América do Sul e aí a gente faz o favor de colocar o post dele...) 

PS: escrevo enquanto pago demasiados guaranis em uma lan house de Assuncion, o texto vai ficar mal escrito e todo sem acento!
É triste quando mesmo você sendo ateu ou pouco religioso sabe o nome e varios religiosos, e pior, você os conhece em tempos de eleicoes! Escutando seus discursos conservadores, de ódio e contra minorías, eu só penso uma coisa: sequestraram o meu Jesus e o vendem como portador de ideias alheias!
Assim, vivemos tempos onde a religiosidade e seus dogmas tem forte influencia no dia-a-dia de seu povo e em decisoes políticas, vide a “rasidade” de discussoes sobre aborto e descriminalizacao de drogas. Discussoes estas que passam a léguas de distancia de um embasamento científico, mesmo entre nossos legisladores. 
Pois bem, assumindo que Jesus foi crucificado em praça publica, esse cara foi no mínimo um agitador, um disseminador de ideias que confrontavam a ordem vigente. Um desses tipos como Tiradentes, Galileu ou Mandela, que como qualquer questionador profundo, é condenado duramente pelos que detém o poder. Regra simples para manter a ordem, sacrifica o questionador e mostra para todos, para que nao façam o mesmo, confere?
Sobre os tais milagres de Jesus, os vejo na verdade, nao como milagres, mas nada mais que certos ilusionismos para passar mensagens. O milagre da multiplicacao dos paes, vejo como nada mais de que o milagre da partilha. Nao creio que Jesus era capaz de fazer pao sem farinha em poucos minutos. O vivente apenas mostrou que se todos compartilhassem o pouco que tinham, todos poderiam saciar sua fome. Agora, estendemos este “milagre” para mil situacoes da nossa vida.
O milagre da pesca, onde varios pescadores estavam cada um a seu jeito pasando redes e nada de peixe, todos cheios de mimimi. Jesus os incentivou, os estimulou e os pôs trabalhar em equipe. E ao fim, os peixes apareceram. Agora, basta aplicar a mensagenzinha para nossa vida cotidiana.
Quando o Nazareno recrimina aqueles que atiram pedras contra Madalena, nao foi um milagre, mas para mim, esse é o maior ensinamento do cara. Ele coloca TODOS como iguais, do menor ao maior dos “pecadores”. Há dois mil anos (!) o cara disse: nao julgue ninguem, cuida da sua vida apenas, ixtepô! Nessa prostituta hoje poderiamos colocar alem da propria prostituta, o favelado, o gay, o imigrante, o nordestino (atualizando para a xenofobia eleitoral). 
E a transformaçao química da agua em vinho na festa de casamento? Para esse milagre eu nao tenho capacidade de interpretaçao. Só posso aceitar, que Jesus deixou a mensagem: Nunca deixe de pedir a saideira se a festa estiver boa !!!! .

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Coragem


A lua é nova. O cigarro queima entre os dedos e penso que o silêncio poderia acalmar a alma inquieta. Não. A inquietude faz parte. O diagnóstico veio em 10 minutos. O sofrimento veio em anos. A cobrança sempre ocorreu e eu nunca tive férias. Cada cigarro que eu acendia, o veneno do remorso me eviscerava. Tomei remédios. “Vai acalmar a alma”. Tomei. Um de manhã. Um de noite. Os anos passaram. As memórias, não. Essas eu sei, hoje, que são para sempre. Que não há pílula que apague ou conversa que resolva. E os anos vieram. As velhas e novas inquietudes (re)surgiram.

Caminhei a noite inteira tentando encontrar o meu próprio silêncio na noite escura. E chovia. Pingava leve e continuamente no meu ombro. Sentia escorrer cada gota pela minha testa, pelo canto do meu olho e meu cabelo pingava. Lágrimas. Chuva. Caminhei sentindo a água lavar o silêncio – aquele que nunca encontrei desde o dia que você decidiu encontrar o seu – para sempre. A coragem dos fracos. A coragem dos inocentes. A coragem que nunca tive.  E admiro a persistência. A desistência. A loucura. Loucura? Loucura é viver sem respirar. Viver esperando. Viver desejando. O desejo dos intocáveis. Viver com medo. Chamaram você de louco. Chamaram você de perdido. Chamaram você de tantas palavras que deixei de escutar.

Os lábios mexiam e o silêncio nunca veio. Você foi. Eu fiquei vagando. Querendo o seu silêncio. Invejando o seu silêncio. E te chamaram de tantos nomes. Acusaram de tantas falhas. Acusaram sem espelhos. E caminhei a noite inteira atrás de uma resposta – não para você, mas para mim. Você foi. Eu fiquei. Querendo. Desejando. Ansiando. Esperando. A vida nunca foi a mesma. A sua. A minha. A nossa. Vaguei por ruas desconhecidas. Sentei em bares estranhos. Conversei com pessoas. Conversei. Chorei. Chorei em ombros que não lembro. Chorei por você. Por mim. Por nós. Pela vida. Pela morte. Pelo desejo dos fracos. Pela coragem dos fracos. Ainda choro.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

nossa amizade

nó no coração
lágrimas entrelaçam
a malha da saudade
moldada na ausência-presença
cartografia da (im)possibilidade

Rafael? presente!
Rafael? estou chegando
a que distância? não importa
presença-ausência
transcende tempo e espaço
na trama do fio entrelaçado

amizade
tecida na simplicidade
não pede licença 
faz a diferença
na geografia das (in)certezas

trama agora mais dilatada
não importa a escala
urdida nos elos da vida
a cumplicidade

na e com a espera
serenidade
marcha sinuosa
no limite dos pontos
vida-morte-eternidade
presença-ausência-presença
nossa amizade.

d.
revisitada em 14/10/2014

                                                                         Foto: Gilliard Lach 

sábado, 11 de outubro de 2014

Um dia perdido



E sexta-feira passou como todos os outros dias. Mais um dia que virou pendência, foi perdido, conta-se em atraso, não pode ser mudado. Um dia em que a euforia e o desespero se cruzam, e no final está distante como os outros. Será que este dia terá algum significado para mim? Decidi algo importante, uma história começou, tive prazer,sorri de forma iluminada, aproveitei a companhia, o lugar, o instante? Qual a intensidade deste dia que passa e qual a intensidade de todos os outros, do passado e do futuro? O que faz dele um dia que não foi perdido? Um dia vivido. 

Se eu soubesse o que quero, talvez pudesse dizer: viver com intensidade e equilíbrio. Talvez sejam dois termos que só possam estar juntos de forma literal em I believe I can fly.  E aí eu complico mais ainda e quero naturalidade, liberdade. Só que eu gosto de programar as coisas. Só que eu gosto de viver o momento. Só que eu gosto de me preocupar com a felicidade alheia. E a apreensão que nos foi mais ensinada que o prazer é opressora do aproveitar a vida.


 O tempo não bastaria para colocar toda a interligação das palavras, pensamentos, ideias, comunicações, sensações, memórias afetivas, colocar tudo no ritmo de uma escuta. Tento me calar. Meu pensamento não me permite. A culpa e o desejo disputam o mesmo espaço. Um documento que não foi entregue, um amigo que não encontrei, a imaginação de uma viagem, a caminhada em uma praia, um quadro de um olhar compartilhado. 

Ocupo minhas mãos para que as tarefas vençam os meus pensamentos, assim venço minha mente e a transformo em apenas mundana.